
Dois sacerdotes
foram enviados como agentes secretos a essas duas províncias; para o Ceará
ofereceu-se o jovem subdiácono José Martiniano de Alencar. A sua oferta foi
aceita por ser ele natural da Vila do Crato e pessoa muito querida pelo pároco
dessa Vila, os párocos do Sertão tinham grande influência. O Capitão-Mor da
mesma vila era um certo Filgueiras, pessoa cruel a quem os sertanejos temiam e
chamavam de bruxo, devido a impunidade com que vivia, sua casa era um covil de
criminosos que cometiam todo tipo de atrocidade ao mais simples aceno de
Filgueiras.
Os ingênuos
patriotas de Pernambuco acreditaram que se conquistando tal indivíduo,
ganhava-se a província inteira do Ceará, e que para ganhá-lo bastaria a vontade
do pároco, o qual não podia deixar de ceder ao pedido do seu predileto. Para
ajudar Martiniano nessa missão, acompanhou-lhe um certo Miguel Joaquim Cézar,
pessoa que parecia prudente e dia ter relações nos sertões daquela província.
Durante a viagem,
iam os mensageiros com cautela, mas se encontrassem alguém disposto a aderir a
causa, poderiam incitar seu patriotismo, mostrando as vantagens de não serem
mais governados por estrangeiros que sugavam as riquezas do Brasil e tratavam a
todos com tirania. Deveriam ir até Pombal ter com o vigário, onde teriam
notícia da comarca do Ceará e do padre Luiz José, caso o vigário de Pombal
estivesse solidário à causa, deveria José Martiniano ficar com ele e dali
escrever cartas aos amigos de Icó, essas cartas deveriam ser persuasivas, mas
sem comprometer o destinatário. Caso o padre Luiz José não estivesse favorável
à revolução, seguiriam até o Crato, mas se pudessem contar com o padre, fariam
a revolução no Crato e Icó. Depois, pedindo apoio a Pernambuco, poderiam seguir
para Aracati e Sobral, e com o apoio dessas quatro vilas, mesmo sem a ajuda de
Pernambuco, poderiam atacar a vila de Fortaleza.
Chegando ao Crato,
Martiniano se separou de seu companheiro, que ficou na fazenda do Padre Luiz
José, e seguiu ao encontro do padre, onde contou-lhe os acontecimentos das
províncias revoltadas, valendo-se da amizade entre os dois para convencê-lo a
conquistar o temível Capitão-Mor. Porém, foi em vão essa tentativa e o padre
tentou dissuadi-lo do contrário, temendo pela vida do amigo, suplicou-lhe que
desistisse da revolução, mas, em vão.
Por acaso, encontrou
Martiniano um carmelita, frei Francisco de Santa Mariana Pessoa, a quem vinha
recomendado. Tentou convencer então, reforçado pelo frei, ao poderoso
Capitão-Mor Filgueiras, que de nada adiantou, nada convencia aquele velho
mandão. Depois de longo silencio originado pelo desprezo e não pela meditação,
dignou-se a responder que a tentativa de revolução era pouco segura e que não a
apoiaria. Pediu então Martiniano, que ao menos não se opusesse a vontade do
povo, a velha raposa concordou, mas era tudo artifício para engana-los, que
crédulos, de nada desconfiaram. Logo Martiniano comunicou aos companheiros e
começaram a planejar a revolução na vila.
O próximo dia santo,
em que ele devia celebrar, foi o dia marcado para o inicio da revolução.
Congregaram-se na igreja os fiéis, ao final de celebração, Martiniano vestido
com sua batina, sobe ao púlpito e conta ao povo as ideias de independência , todos
gritaram vivas e aplaudiram, retiraram-se para o terreno em frente a igreja e
hastearam um bandeira branca, em sinal de alegria, dispararam a espingarda que
traziam. Continuavam a festejar quando viram Filgueiras ao longe, isso fez com
que cabisbaixos todos fossem para suas casas. E vão tentou Martiniano
convencê-los de que a presença do homem era para testemunhar a alegria, pois
seria tolerante com a manifestação. Poucos creram nisso e com simplicidade
entoaram vivas à Pátria. Aproximou-se então o Capitão-Mor e com um simples
gesto, impôs silencio, fez arrancarem a bandeira branca e com que gritassem
“Viva El-Rei”, todos humildemente obedeceram. Ainda não satisfeito, mandou
agarrarem Alencar e três dos seus principais companheiros e leva-los para a cadeia,
onde com pesadas correntes no pescoço, foram arrastados de prisão em prisão até
a capital, sofrendo todo tipo de tormentos e torturas, por toda a viagem. Não
escaparam da fúria do monstro nem mesmo o padre Luiz José e D. Bárbara de
Alencar, bem como outros revolucionários, alguns dias depois. Assim finalizou a
revolução do Crato, as demais vilas não deram sinal de vida.
Era governador do
Ceará, Manoel Inácio de Sampaio, e sua vigilância redobrou depois isso. Não
tendo forças suficientes para atacar as províncias insurgidas, contentou-se em
assegurar a que governava, dando ordens severas a todos os Capitães-Mores e
agindo com toda a violência contra qualquer cidadão do qual desconfiasse, como
fez com o ouvidor da comarca João Antônio Rodrigues de Carvalho, que por ter
tido relações de amizade com Domingos José Martins, a ambos mandou prender e
transferir para as prisões de Lisboa.
Fonte: Revista do Instituto do Ceará – A história da
revolução de 17, por Muniz Tavares na parte relativa ao Ceará.
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200 ANOS. O CEARÁ NA
REVOLUÇÃO PERNAMBUCANA
História: O Ceará
teve participação discreta (e restrita ao Cariri) na Revolução Pernambucana,
mas fato serviu para o crescimento da influência política da família Alencar.

Embora o centro das
ações tenha sido, como o nome da revolta sugere, em Pernambuco, o Ceará teve
participação no processo. Mais especificamente o Cariri. Lá e naquela época, a
família Alencar começava a expandir a influência política e econômica para além
do nível local. Bárbara de Alencar, a matriarca do clã, e os filhos José
Martiniano (pai do romancista José de Alencar) e Tristão Gonçalves foram os
principais artífices locais da insurreição no Ceará.
Das quatro
províncias em que houve revolta, o Ceará foi onde ela ocorreu de maneira mais
discreta. Do dia que José Martiniano liderou a tomada da Câmara da Vila do
Crato até o fim da “república” no Ceará foram apenas oito dias. Além do Crato,
apenas a vila de Jardim — outro reduto de influência dos Alencar — foi tomada.
Os antecedentes que
fizeram eclodir no Ceará a revolta são os mesmos das demais províncias em que
ela ocorreu (Rio Grande do Norte e Paraíba, além de Pernambuco). A região
Nordeste passava como um todo por uma crise econômica provocada pela seca dos
anos 1816-17, o que impactou diretamente nas exportações de algodão e açúcar.
Além disso, começou a ser despertado um sentimento de lusofobia pelo fato de
portugueses ocuparem os principais cargos administrativos da região e da alta
quantia de remessas enviadas ao Rio de Janeiro com a chegada da corte de dom
João VI ao Brasil.
O fim da revolta no
Ceará se deu pela própria falta de força do movimento. A família Alencar tinha
poder restrito ao Cariri e não conseguiu arregimentar lideranças nessa e em
outras regiões. Embora tenham contado inicialmente com o apoio de José Pereira
Filgueiras, capitão-mor e amigo da família, esse mesmo se viu pressionado pelo
governador Inácio Sampaio a reprimir rapidamente a insurreição.
Além disso, naquele
mês de maio, as tropas de dom João VI já fechavam o cerco a Pernambuco,
impondo-lhe derrotas em batalhas significativas, o que enfraquecia o movimento.
Enquanto isso, o Rio Grande do Norte havia sido retomado pelas tropas reais em
abril. Mesmo situação que ocorreria na Paraíba no dia 7 de maio.
Apesar do caráter
discreto da Revolução Pernambucana em solo cearense, ela acabou tendo
relevância à medida que a família Alencar passaria, a partir dali, a ter maior
influência, mesmo com Bárbara, José Martiniano e Tristão tendo ficado presos e
sendo, em seguida, anistiados. Era o primeiro momento de revolta deles contra a
Coroa. Sete anos depois, estavam todos eles — inclusive Pereira Filgueiras —
lutando contra o poder de dom Pedro I na Confederação do Equador.
Personagens da
revolução no Ceará
Bárbara de Alencar
Matriarca da família
Alencar, dona de terras e de prestígio no Cariri. Deu apoio inconteste aos
filhos José Martiniano, Tristão Gonçalves e Carlos José dos Santos na
instalação da Revolução no Ceará.
Inácio Sampaio
Governador da
província do Ceará e fiel à Coroa portuguesa. Reprime com veemência qualquer
tipo de ação de caráter republicana.
José Pereira
Filgueiras
Era o capitão-mor
responsável por acabar qualquer tipo de distúrbio social. Se mantém isento nos
primeiros dias, mas é pressionado pelo governador Sampaio a acabar com a
revolta. Vai insurgir contra dom Pedro I sete anos depois na Confederação do
Equador.
José Martiniano de
Alencar
Filho de Bárbara e
pai do romancista José de Alencar, tinha apenas 22 anos em 1817. Trouxe do
Seminário de Olinda as ideias iluministas e liberais que permearam a revolução.
OBRIGADA <3<3
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