José Luiz de
Mendonça: Nasceu no Recife em meados do século XVIII. Seguiu carreira militar,
logrando a patente de capitão em 1814. Suas edeias receberam apreço de muitos
republicanos, haja vista a participação de José Luiz nos clubs fomentadores de
teorias liberais, como os do Cabo, de Suassuna e por ser um dos criadores da
Academia do Paraíso. Seu papel conciliador também foi importante: declarada a
Revolução Pernambucana, foi José Luiz negociar pessoalmente a retirada do
capitão-general Caetano Pinto, que estava a serviço da Coroa. Membro do Governo
Provisório, foi José Luiz contestado enquanto republicano, por considerar
relevante a criação de um documento formal, justificando ao rei D. João VI o
porquê do movimento insurreto. Respondendo aos críticos, publicou um texto
intitulado "PRECISO", no qual endossa as posições da república e do modelo
liberal, no dia 10 de maio de 1817. Em virtude do recuo das tropas
republicanas, rendeu-se e foi mandado à Bahia bordo do navio Carrasco. Em
seguida, foi submetido a julgamento e arcabuzado no dia 12 de junho de 1817.
“PRECISO dos
sucessos que tiveram lugar em Pernambuco, desde a faustíssima e gloriosíssima
Revolução operada felizmente na Praça do Recife, aos seis do corrente mês de
março, em que o generoso esforço de nossos bravos PATRIOTAS exterminou daquela
parte do Brasil o monstro infernal da tirania real.”
Depois de tanto abusar da nossa
paciência por um sistema de administração combinado acinte para sustentar as
vaidades de uma Corte insolente sobre toda a sorte de opressão de nossos
legítimos direitos restava caluniar agora a nossa honra com o negro labéu de
traidores aos nossos mesmos Amigos, Parentes e Compatriotas naturais de
Portugal; e era esta porventura a derradeira peça que faltava de se pôr à
máquina política do insidioso governo extinto de Pernambuco.
Começou
o pérfido por ilaquear a nossa singeleza proclamando publicamente a 5 deste mês
que era amigo sincero dos Pernambucanos, que tinha repartido o seu coração com
eles, escrevendo estes enganos com a mesma pena com que acabava de encher no
segredo do seu gabinete listas de proscritos, que tinha de entregar nas mãos do
algoz. Brasileiros de todas as classes, a mocidade de mais espírito do país, os
oficiais mais bravos das tropas pagas, em uma palavra, os filhos da pátria de
maior esperança e mais distinto merecimento pessoal.
Amanhecendo
enfim o dia 6 em que as enxovias haviam de ser atulhadas de tantos Patriotas
honrados, e suas famílias alagadas de dor, e de lágrimas: convoca o maldito um
conselho de oficiais de guerra, todos invejosos de nossa glória, e depois de
ter assinado com eles a atroz condenação daquelas inocentes vítimas, despacha
ali mesmo os que lhe parecerem mais capazes de lhe dar execução. Uns correm aos
quartéis militares, outros a casas particulares; fervem prisões por toda a
parte e já as cadeias começam a se abrir para ir engolindo um por um dos nossos
bons Compatriotas.
Aqui,
porém, mostraram os nossos como tinham capacidade para saber conhecer que a
desobediência tem todo preço de heroísmo em certos casos, e é quando com ela se
salva a causa da Pátria. Um bravo Capitão seu o sinal do dever de todos,
fazendo descer aos Infernos o principal agente da injustíssima execução;
correu-se às armas , e poucas horas daquele mesmo dia foram todo o tempo de
começar a acabar tão ditosa revolução, que mais pareceu festejo de paz que
tumulto de guerra, sinal evidente de ter sido toda obra da Providência e
benefício da bênção do todo Poderoso.
O
Ex-General tinha se recolhido à fortaleza do Brum, e onde supunha achar uma
praça de defesa, achou a prisão de sua pessoa e dos seus. Recorreu a
proposições pacíficas, que acabaram num conclusum (sic) com que foi obrigado a
conformar-se no dia sete, pelas seis horas da manhã.
Desde
logo foi restabelecida toda ordem política, não se ouviram mais outras vozes que
de aclamações gerais dignas do dia em que um imenso entrava na posse de seus
legítimos direitos sociais. Foi consequência disso não ter havido até agora
sequer um só distúrbio, nem motivo qualquer de queixa.
A
oito se instalou o Governo Provisório composto de cinco Patriotas, tirados das
diferentes classes; o qual o Governo tem sido permanente em suas sessões. O seu
primeiro cuidado foi desabusar os nossos Compatriotas de Portugal dos medos e
desconfianças, em que os tinham inquietado os partidistas da tirania, recebendo
a todos com abraços e ósculos, segurando as suas famílias, e pessoas, e
propriedades de toda a sorte de injúrias, fazendo-os continuar em seu comércio,
tráfegos e ocupações com mais liberdade que dantes, proclamando enfim por um
bando os sentimentos do Governo, e do Povo, e não haver mais daqui por diante
diferenças entre nós de Brasileiros e Europeus, mas deverem todos ser tidos em
conta de uma só e única família, com igual direito a uma só e mesma herança,
que é a prosperidade geral de tida esta Província.
A
nove tudo se achava no mesmo espírito de concórdia e pacificação geral, sem que
o povo se ressentisse de outra novidade que das bondades do Governo, todo
aplicado a promover a segurança interior e exterior por medidas acertadas, buscando
esclarecer a sua marcha com dividir as matérias de maior importância por
comitês composto de pessoas de maior capacidade conhecida para cada um delas,
com que tem obtido ao mesmo tempo popularizar as suas deliberações o mais
possível.
Naquele
mesmo dia o Governo foi permanente até à meia-noite para continuar diversos
despachos, que hoje apareceram, sendo dos mais importantes fazer entrar os Funcionários
públicos nas suas ocupações como dantes, sem tirar ninguém do seu ofício, proscrever
as fórmulas de tratamento até agora usadas sem admitir nenhuma outra que a de –
VÓS – mesmo com ele Governo, abolir certos impostos modernos de manifesta
injustiça e opressão para o povo, sem vantagem nenhuma da nação. etc. E tal é o
nosso estado político, e civil, até hoje, 10 de março de 1817.
Viva
a Pátria, vivam os patriotas e acabe para sempre a tirania real.
O
Pe. João Ribeiro Pessoa de Melo Montenegro
Antônio
Carlos Ribeiro de Andrade Machado
Manuel
Correia de Araújo
Francisco
de Paula Cavalcanti de Albuquerque
Luiz
Francisco de Paula Cavalcanti
Domingos José Martins
-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-O-
15 de Março de 1817
O Governo Provisório
da República de Pernambuco, revestido da Soberania pelo povo, em quem ela só
reside, desejando corresponder à confiança do dito povo, e conhecendo que sem
formas e regras fixas e distintas o exercício das funções que lhe são atribuídas,
por vago, inexato e confuso, não pode deixar de produzir choques, e dissensões
sempre nocivas ao bem geral, e assustadoras da segurança individual, fim e alvo
dos sacrifícios sociais. Decreta e tem decretado.
1º
Os poderes de
execução estão concentrados no Governo Provisório, enquanto se não conhece a
Constituição do Estado determinada pela Assembleia Constituinte, que será
convocada assim que se incorporarem as comarcas, que formavam a antiga
capitania e ainda não têm abraçado os princípios da independência.
2º
Para o exercício da
Legislatura haverá um Conselho permanente composto de seis membros escolhidos
pelas câmaras na mesma forma em que são escolhidos os seus oficiais a [....] da
aprovação do corregedor dentre os patriotas de mais probidade, e luzes em
matérias de administração pública, e que não sejam parentes entre si, até
segundo grau canônico.
3º
O Governo e Conselho
assim reunidos formarão a Legislatura propriamente dita, e a decisão da
pluralidade dará existência aos atos de Legislatura ou decretos, que serão
assinados pelo Governo só sendo porém passados em Conselho à pluralidade o que
se declarará, pena de insanável nulidade, e ninguém deverá lhe dar a devida
execução.
4º
As sessões de
Legislatura continuarão todos os dias à exceção dos consagrados aos cultos
divinos. Elas começarão às seis horas da tarde, e durarão por todo o tempo que
a discussão e conclusão dos negócios propostos o exigir. Serão presididas pelos
cinco membros do Governo um cada semana, o qual mal se assentar, guardar-se-á o
mais inviolável silêncio, estando todos atentos ao que se propõe e opina, não
interrompendo uns aos outros, mas opondo-se mal findar algum de falar, as
objeções que se tiver contra a opinião emitida. Nas ditas sessões escreverá as
deliberações o secretário do interior.
5º
Os projetos da Lei,
depois de propostos ficarão sobre a mesa pelo espaço de seis dias, para dar
tempo a que os membros o meditem e se aprontem para a discussão, para cujo fim
em trabalhando a imprensa, serão impressos e distribuídos por cada membro.
6º
Cada membro opinará
com plena liberdade, e igualdade e pela opinião que emitir em Conselho ninguém
será increpado e menos perseguido.
7º
Serão membros do
Conselho além dos seis de que ele se compõe os secretários do Governo, o
Inspetor do Erário e o Bispo de Pernambuco, e na sua falta o Deão.
8º
Para o exercício do
Poder Executivo criam-se duas secretarias, uma para o expediente dos negócios
do Interior, Graça, Polícia, Justiça e Cultos; outra para o expediente dos
negócios da Guerra, Fazenda, Marinha, e Negócios Estrangeiros. Os patriotas
nomeados para estes empregos nomearão os oficiais que carecerem e farão subir
ao Governo para sua aprovação.
9º
O despacho dos
negócios pertencentes às duas Secretarias far-se-á todos os dias das nove horas
da manhã em diante e durará o tempo preciso para sua ultimação.
10º
Parecendo ao Governo
ouvir o Conselho sobre medidas que deva tomar na parte executiva convocá-lo-á,
e as sessões neste caso se farão fora do alcance dos ouvidos curiosos para não
abortarem negócios que dependem de segredo.
11º
Pelos atos do
Governo que minem a Soberania do povo e os direitos dos homens e que produzam
desarmonia entre os diferentes membros da república serão responsáveis os
governador es que os assinarem e os secretários por cuja secretaria forem
passados, e não devem por esse motivo ter execução sem a prévia assinatura do
secretário respectivo. Os secretários podem ser logo acusados, os governadores
porém só findo o seu tempo de serviço.
12º
Para a boa
administração, arrecadação, e compatibilidade das rendas públicas, cria-se um
inspetor do Erário, a quem é sujeita toda a repartição, e que só depende do
Governo de quem recebe ordens pela Secretaria da Fazenda. E ordena-se que a
receita e despesa das rendas se publique cada ano por via da imprensa.
13º
A administração da
Justiça na primeira instância fica a cargo de dois juízes ordinários, que serão
eleitos em cada cidade e vila pelo povo do seu distrito na forma estabelecida,
e as eleições serão remetidas ao Colégio de Justiça, de que abaixo se faz
menção para aprovação das pautas. A um deles pertencerá o expediente Crime, e
de Polícia; ao outro o das contendas cíveis, e bom regime dos órfãos e
Enjeitados. Não terão salário algum do público, nem coisa alguma das partes
pelo desempenho de suas funções, contentando-se com o respeito que lhes resulta
do exercício dos seus cargos. Deles se agravará e apelará em direitura para o
Colégio de Justiça. Serão os inquiridores, distribuidores e contadores do seu
juízo tudo gratuitamente.
14º
São extintos os
ouvidores e corregedores das comarcas e igualmente os juízes de órfãos nas
vilas aonde os há, por serem cometidas suas atribuições aos juízes ordinários.
15º
Cria-se na capital
do governo um Colégio Supremo de Justiça para decidir em última instância as
causas cíveis e crimes. Será composto o dito colégio de cinco membros
literatos, de bons costumes, prudentes e zelosos do bem, público.
16º
Serão pagos os
membros do Colégio pelo Erário, sendo-lhes vedado receber salário algum,
assinaturas ou prós das partes que perante eles requererem a fim de evitar as
concussões.
17º
Farão cada ano dois
membros do Colégio Supremo de Justiça a visita dos julgados do Estado, e
conhecerão das omissões, e comissões dos juízes ordinários para se lhes dar a
devida pena. Terão estes juízes de alçada uma ajuda de custo do Governo além do
salário e aposentadoria à custa das Câmaras ou municipalidades.
18º
Os magistrados uma
vez empregados não podem mais ser removidos senão por sentença, em pena de suas
prevaricações.
19º
O Colégio de Justiça
deverá apresentar ao Governo pela secretaria da Justiça os planos tendentes ao
melhoramento desta repartição e reforma de abusos nela introduzidos.
20º
Para decisão dos
crimes dos militares em última instância cria-se uma Comissão Militar, composta
de quatro membros, dois do Colégio de Justiça e dois oficiais generais, e na
sua falta coronéis. A Comissão será presidida pelo General das Armas.
21º
As leis até agora em
vigor e que não estão, ou forem ab-rogadas, continuarão a ter a mesma
autoridade enquanto lhes não for sub-rogado um código nacional e apropriado às
nossas circunstâncias e precisões.
22.°
A administração das
Câmaras ou Municipalidades continua no pé antigo.
23.°
A religião do Estado
é a Católica Romana, todas as mais seitas cristãs de qualquer denominação são
toleradas. É permitido a cada um dos ministros defender a verdade da sua
comunhão. É-lhes porém vedado o incentivar em púlpito e publicamente umas
contra as outras, pena de serem os que o fizerem perseguidos como perturbadores
do sossego público. É proibido a todos os patriotas o inquietar e perseguir a
alguém por motivos de consciência.
24º
Os ministros da
comunhão católica são assalariados pelo Governo, os das outras comunhões porém
só o podem ser pelos indivíduos da sua comunhão. E basta que haja de cada
comunhão vinte famílias numa povoação para o governo conceder-lhes à sua
instância a ereção dos lugares de adoração e culto de sua respectiva seita, nos
quais porém não poderão ter sinos.
25º
A liberdade de
imprensa é proclamada, ficando porém o autor de qualquer obra, e seu impressor
sujeito a responder pelos ataques feitos à Religião, à Constituição, bons
costumes e caráter dos indivíduos na maneira determinada pelas leis em vigor.
26º
Os europeus entre
nós naturalizados e estabelecidos que derem prova de adesão ao partido da
regeneração e liberdade são nossos patriotas e ficam habilitados para entrar
nos empregos da república para que forem hábeis e capazes.
27º
Os estrangeiros de
qualquer país e comunhão cristã que sejam podem ser entre nós naturalizados por
atos do Governo e ficam hábeis para exercer todos os cargos da República uma
vez assim naturalizados.
28º
O presente governo e
suas formas durarão somente enquanto se não ultimar a Constituição do Estado. E
como pode suceder o que não é de esperar, e Deus não permita que o Governo para
conservar o poder de que se acha apossado frustre a justa expectação do povo,
não se achando convocada a Assembleia Constituinte dentro de um ano da data
deste ou não se achando concluída a Constituição no espaço de três anos, fica
cessado de fato o dito Governo, e entra o povo no exercício da soberania para o
delegar a quem melhor cumpra os fins da sua delegação.
Parabéns! Nunca tinha visto o texto da Lei Orgânica. Foi um achado!
ResponderExcluiroi! você poderia me dizer a referência desse documento? Onde eu posso encontrar ele em Pernambuco?
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